Graffiti e Crítica na Sociedade Pompeiana

 

Priscila Pedrosa de Oliveira Vagno da Silva*

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Resumo: Analisaremos o papel desempenhado pelos “graffiti” na sociedade pompeiana entre os séculos II a.C e I d.C. como forma de informação sobre Pompéia.


Palavras-Chave: Graffiti, Sociedade, Pompéia.

 

A antiga cidade de Pompéia, localizada próxima à baía de Nápoles, na região da Campânia, teve grande parte de sua cultura material preservada. Isso, graças às cinzas do vulcão Vesúvio, o mesmo que dizimou grande parte da população e soterrou a cidade de Pompéia no ano de 79 d.C. Suas descobertas iniciaram em 1748, sob os auspícios do monarca Carlos de Bourbon, foi de grande valor para as pesquisas sobre as cidades romanas.

Parte considerável da estrutura arquitetônica da cidade foi preservada, o que contribuiu também para a conservação dos grafites. As inscrições parietais, ou “graffiti”, são inscrições ou desenhos parietais, ou seja, que utilizam as paredes como suporte. Esses registros geralmente são de pequeno porte e encontrados por toda a cidade de Pompéia, nas ruelas, nas paredes externas de casas e prédios públicos, mas também no seu interior. O termo grafite é derivado da palavra graphium, nome do instrumento semelhante à um estilete, que era utilizado para fazer os sulcos nas paredes.

Os autores dos grafites, faziam uso, em sua maioria, do anonimato. O que proporcionava uma maior liberdade de expressão, além de ser um canal comunicativo amplo, no qual qualquer indivíduo poderia se manifestar. Segundo Pedro Paulo Funari, o caráter público dos grafites “confere as intervenções murais traços únicos no contexto da criação cultural popular. Em primeiro lugar quebram a hegemonia dos meios de comunicação social por parte das elites e impossibilitam qualquer tipo de censura ou limitação” (FUNARI, 2003: 83).

Segundo Renata Garraffoni (2007: 155), “impulsivo, imediato e espontâneo o grafite é um registro singular que marca um momento específico ou uma necessidade pessoal de deixar registrado uma insatisfação, uma piada ou uma declaração de amor”. Vemos aqui, que os grafites abordam diversos temas, usando-se de diversas linguagens e estilos. Dentro dessa variedade de estilos, estão as caricaturas, imagines ridiculae, que podiam ser interpretadas como um indicativo de falta de poder ou autoridade. Segundo Pedro Paulo Funari e Marina Cavicchioli, "imagines ridiculae ressaltam conotações reprováveis, provavelmente também determinantes nos traços ambíguos" (FUNARI & CAVICCHIOLI, 2005: 314).

O grafite CIL IV 9226 (Figura 1), datado entre o século II a.C e o século I d.C., utiliza duas  linguagens: a verbal e a não-verbal, sendo essa última também caricatural. Trata-se de uma representação de um homem da elite de Pompéia, um magistrado de nome, N. Istacídio Rufo. A ancoragem acima do desenho, inclusive, o apresenta: “Rufus est, ou seja, “Este é Rufo”.  Utilizando o método de Martine Joly, que tem por base a semiótica, separamos os signos da imagem e a analisamos. De modo que o nariz e o queixo exagerados revelam uma ridicularização do retratado, causando o riso. A calvície indica experiência, assim como idadeavançada,se tratando de um idoso. E a coroa de louros indica se tratar de um magistrado. Um ponto que vale ser destacado, é que esse registro foi feito dentro da casa do retratado, a Vila dos Mistérios, em Pompéia, por um autor anônimo. Outro grafite, CIL IV 1810 (Figura 2), também nos detém atenção, por sua semelhança estética com o grafite “Rufus”.  Possuindo os mesmos signos e que também nos leva a crer se tratar de um magistrado. Também se trata de uma caricatura e a ancoragem apresenta: “Peregrinus”, que literalmente pode indicar se tratar de um estrangeiro, mas que na realidade, nos leva a crer se tratar de um praetor peregrinus, uma categoria de pretor que tinha a função de resolver questões e aplicar a justiça para estrangeiros em Roma. Esse grafite também é de autoria anônima e está localizado em Pompéia, mas dessa vez em um prédio público, a Basilica, lugar onde eram realizados tribunais.

A partir desses grafites é possível observar críticas jocosas sendo feitas às autoridades, à elite, em prédios públicos como também na própria casa do retratado, e sem censura. E ainda, observamos que apesar de terem sido feitos em pontos diferentes, e muito provavelmente por autores diferentes, de serem espontâneos, havia um padrão estético, que utilizava os mesmos signos com os mesmos significantes.

Figura 1 – Grafite CIL IV 9226

 

Figura 2 – Grafite CIL IV 1810

Priscila Pedrosa de Oliveira Vagno da Silva - Lattes

Especialista em História Antiga e Medieval pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (NEA/UERJ)

Bacharela em Educação Artística, com Habilitação em Artes Plásticas, pela Escola de Belas Artes da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)